"O amor é paciente e benigno, não arde em ciúmes, não se ufana, não se ensoberbece, não se conduz inconvenientemente, não procura os seus interesses, não se exaspera, não se ressente do mal, não se alegra com a injustiça, mas regozija-se com a verdade, tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo supera... O amor jamais acabará".
sexta-feira, 22 de maio de 2009
Receita de Mulher
As muito feias que me perdoem, mas beleza é fundamental.
É preciso que haja qualquer coisa de flor em tudo isso,qualquer coisa de dança, qualquer coisa de haute couture em tudo isso (ou então Que a mulher se socialize elegantemente em azul, como na República Popular Chinesa).
Não há meio-termo possível.
É preciso, que tudo isso seja belo.
É preciso que súbito, tenha-se a impressão de ver uma garça apenas pousada e que um rosto adquira de vez em quando essa cor, só encontrável no terceiro minuto da aurora.
É preciso que tudo isso seja sem ser, mas que se reflita e desabroche no olhar dos homens.
É preciso, é absolutamente preciso que seja tudo belo e inesperado.
É preciso que umas pálpebras cerradas lembrem um verso de Éluard e que se acaricie nuns braços. Alguma coisa além da carne: que se os toque como no âmbar de uma tarde.
Ah, deixai-me dizer-vos que é preciso que a mulher que ali está como a corola ante o pássaro seja bela ou tenha pelo menos um rosto que lembre um templo e seja leve como um resto de nuvem: mas que seja uma nuvem com olhos e nádegas.
Nádegas é importantíssimo.
Olhos então, nem se fala, que olhe com certa maldade inocente.
Uma boca fresca (nunca úmida!) é também de extrema pertinência.
É preciso que as extremidades sejam magras; que uns ossos despontem, sobretudo a rótula no cruzar das pernas, e as pontas pélvicas no enlaçar de uma cintura semovente.
Gravíssimo é porém o problema das saboneteiras: uma mulher sem saboneteiras é como um rio sem pontes. Indispensável.
Que haja uma hipótese de barriguinha, e em seguida a mulher se alteie em cálice, e que seus seios sejam uma expressão greco-romana, mas que gótica ou barroca e possam iluminar o escuro com uma capacidade mínima de cinco velas.
Sobremodo pertinaz é estarem a caveira e a coluna vertebral levemente à mostra; e que exista um grande latifúndio dorsal!
Os membros que terminem como hastes, mas que haja um certo volume de coxas e que elas sejam lisas, lisas como a pétala e cobertas de suavíssima penugem no entanto, sensível à carícia em sentido contrário.
É aconselhável na axila uma doce relva com aroma próprio apenas sensível (um mínimo de produtos farmacêuticos!).
Preferíveis sem dúvida os pescoços longos de forma que a cabeça dê, por vezes, a impressão de nada ter a ver com o corpo, e a mulher não lembre flores sem mistério.
Pés e mãos devem conter elementos góticos discretos.
A pele deve ser frescas nas mãos, nos braços, no dorso, e na face, mas que as concavidades e reentrâncias tenham uma temperatura nunca inferior a 37 graus centígrados, podendo eventualmente provocar queimaduras do primeiro grau.
Os olhos, que sejam de preferência grandes e de rotação pelo menos tão lenta quanto a da Terra; e que se coloquem sempre para lá de um invisível muro de paixão que é preciso ultrapassar. Que a mulher seja em princípio alta ou, caso baixa, que tenha a atitude mental dos altos píncaros.
Ah, que a mulher dê sempre a impressão de que se fechar os olhos, ao abri-los ela não estará mais presente com seu sorriso e suas tramas.
Que ela surja, não venha; parta, não vá e que possua uma certa capacidade de emudecer subitamente e nos fazer beber o fel da dúvida.
Oh, sobretudo que ela não perca nunca, não importa em que mundo não importa em que circunstâncias, a sua infinita volubilidade de pássaro; e que acariciada no fundo de si mesma, transforme-se em fera sem perder sua graça de ave; e que exale sempre o impossível perfume; e destile sempre o embriagante mel; e cante sempre o inaudível canto da sua combustão; e não deixe de ser nunca a eterna dançarina do efémero; e em sua incalculável imperfeição constitua a coisa mais bela e mais perfeita de toda a criação inumerável.
-Vinicius de Moraes-
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Um comentário:
Lis,que bela sua postagem!Vinicius é sempre Vinicius,o poeta do amor!Abraços,
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